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Os protestos do Black Lives Matter nos fizeram aprender mais sobre o coronavírus

Embora centenas de milhares de manifestantes e policiais se amontoassem nas ruas, o distanciamento social se fortaleceu nas cidades com os maiores protestos.

Mais de três semanas depois de centenas de milhares de americanos começarem a irem às ruas para protestar pela morte de George Floyd pelas mãos de um policial de Minneapolis, os aumentos previstos nos casos de COVID-19 não aconteceram nas cidades com os maiores protestos.

Alguns comentaristas já estão especulando que a falta de picos de casos de coronavírus relacionados aos protestos significa que as regras de distanciamento social não são tão importantes se as pessoas ficarem ao ar livre e usarem máscaras — como fizeram muitos manifestantes. O site Slate chegou ao ponto de sugerir que "uma variedade bem maior de atividades ao ar livre — eventos esportivos, praias, piscinas, parquinhos e assim por diante — poderia ser permitida com segurança muito antes do planejado atualmente".

Mas alguns especialistas dizem que adotar essa conclusão precipitadamente pode ser um erro grave. "Eu acho uma boa notícia que não tenhamos surtos enormes até o momento", disse Kate Grabowski, epidemiologista da Universidade Johns Hopkins, ao BuzzFeed News. "Mas tudo o que aprendemos com a epidemiologia desse vírus nos diz que aqueles que se aproximam de pessoas infectadas estão correndo risco."

Além disso, uma nova análise com base em dados de rastreamento de telefones celulares indica um motivo surpreendente para a falta de picos de COVID-19 relacionados aos protestos: nas cidades com grandes protestos, a população em geral gastou mais tempo em casa durante as manifestações — sugerindo que qualquer aumento causado pela transmissão do vírus nos próprios protestos teria sido compensado por um aumento no distanciamento social entre o restante da população das cidades.

Novos casos por dia em alguns condados com protestos

Chart of new cases per day for selected counties with major .

Embora os especialistas consultados pelo BuzzFeed News concordem que usar máscaras e ficar ao ar livre possam ter reduzido o risco de transmissão viral nos protestos, eles também apontaram outros fatores possíveis. Muitos dos manifestantes eram jovens, por exemplo, o que significa que novas infecções que ocorressem durante as manifestações teriam menos probabilidade de causar sintomas graves e aparecer nas contagens oficiais de casos. E, embora centenas de milhares de pessoas tenham participado dos protestos, esse ainda é um número relativamente pequeno em comparação com a população total das cidades envolvidas — portanto, pode ser difícil notar a transmissão do coronavírus nos protestos.

"O fato é que nunca teremos certeza, porque há muitas variáveis", disse Andrew Noymer, epidemiologista da Universidade da Califórnia em Irvine.

A descoberta surpreendente de que os protestos causaram um aumento geral no distanciamento social nas cidades em que ocorreram vem de uma análise divulgada pela empresa Safegraph, realizada por pesquisadores da Universidade Estadual de San Diego, da Universidade do Colorado em Denver e da Universidade Bentley em Waltham, Massachusetts. Embora os dados agregados de rastreamento de telefones celulares da Safegraph não permitissem que os pesquisadores seguissem as pessoas, eles puderam relacionar os horários dos protestos à extensão em que a população das cidades como um todo ficou em casa.

"É preciso entender o que está acontecendo com todas as várias partes da população", disse Andrew Friedson, economista de saúde da Universidade do Colorado em Denver e um dos pesquisadores por trás do estudo. "Muitas dessas cidades têm população na casa dos milhões."

Friedson e seus colegas descobriram que as pessoas nas grandes cidades que não tiveram protestos, como Aurora, Colorado, e Irving, Texas, se movimentaram mais durante a agitação do que as pessoas nas cidades que os tiveram. E, nas cidades com protestos, o comportamento de ficar em casa aumentou após o início da agitação. Os pesquisadores descobriram que os toques de recolher não foram suficientes para explicar essa mudança, sugerindo que muitas pessoas optaram por ficar em casa para evitar se deparar com confrontos entre a polícia e os manifestantes.

Quando a agitação aumentou, algumas cidades criaram estações de testagem de COVID-19 para manifestantes. Os resultados iniciais desses testes corroboram a ideia de que relativamente pouca transmissão do coronavírus ocorreu nos protestos do Black Lives Matter. Em Seattle, menos de 1% dos testados deram positivo para COVID-19, de acordo com uma declaração do gabinete do prefeito divulgada em 12 de junho. Em Boston, cerca de 2,5% dos manifestantes que foram testados deram positivo para o coronavírus — uma porcentagem parecida com a da cidade como um todo. E, em Minneapolis, o número foi de 1,8%, relatou a Wired na semana passada.

Ainda assim, especialistas advertem que grandes aglomerações representam um risco de um "evento superdisseminador", em que uma única pessoa infecta muitas outras — como aconteceu em uma igreja na Coreia do Sul, nos estágios iniciais de seu surto, e em um funeral em Albany, na Geórgia, em 29 de fevereiro.

"Ainda pode haver um evento superdisseminador que ainda não vimos, decorrente dos protestos, em vista de outros casos", disse Gerardo Chowell, epidemiologista da Universidade Estadual da Geórgia em Atlanta. Mas ele observou que a maioria dos eventos superdisseminadores conhecidos ocorreu em reuniões em ambientes fechados.

Mesmo que os protestos do Black Lives Matter não pareçam ter provocado um pico na transmissão de coronavírus, novos casos estão surgindo em estados do sul e do oeste dos EUA. Na maioria das vezes, esses aumentos começaram antes do início dos protestos e parecem ter sido causados pelos esforços para reabrir a economia nesses estados e por eventos públicos que ocorreram no fim de semana do Memorial Day, no fim de maio.

"Em sua maioria, o momento desses picos, como no Arizona, se encaixa na linha do tempo de relaxamento das restrições e redução dos esforços de distanciamento social", disse Saskia Popescu, epidemiologista da Universidade George Mason em Fairfax, Virgínia, e membro da Força-Tarefa contra o Coronavírus da Federação de Cientistas Americanos, ao BuzzFeed News por e-mail.

Novos casos por dia em alguns estados e em todos os EUA

Chart of new cases per day for selected states and the entire US.

Agora, esses surtos estão aumentando o número de novos casos nos EUA como um todo, o que vinha diminuindo lentamente desde o início de abril, alarmando especialistas em saúde pública.

"O fato de os casos gerais nos Estados Unidos estarem seguindo na direção errada é muito preocupante já que estamos há 5 meses na primeira onda", disse Howard Koh, da Faculdade de Saúde Pública de Harvard T. H. Chan e ex-secretário de saúde assistente da administração Obama. "Não temos uma estratégia coordenada nacional no momento. Temos 50 estados se movendo em 50 direções diferentes."

Este post foi traduzido do inglês.

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