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Estes cientistas sabem que os incêndios na Amazônia são graves porque viram como foi 20 anos atrás

"Um único incêndio, de baixa intensidade, com chamas apenas até a altura dos joelhos, pode matar 80% das árvores em uma floresta."

Ao visitar pessoalmente a Floresta Amazônica brasileira no início dos anos 2000, Douglas Morton viu um cenário que ele chamou de “apocalíptico”: vegetação carbonizada a seus pés, fumaça cobrindo os céus em qualquer direção que ele olhasse e uma névoa alaranjada pairando no ar.

A fonte de toda essa destruição, e a motivação para as viagens de Morton de volta ao Brasil ano após ano, era o desmatamento desenfreado. Morton, agora cientista da NASA, a agência espacial dos EUA, foi um dos pesquisadores que descobriram como usar melhor os satélites para monitorar o desmatamento.

"Os primeiros anos que passei na Amazônia foram alguns dos anos com os maiores índices de desmatamento que já mapeamos a partir de informações de satélite", disse Morton, chefe do Laboratório de Ciências Biosféricas do Centro Goddard de Vôo Espacial da NASA, ao BuzzFeed News. As descobertas feitas por pesquisas daquela época, graças às imagens de satélites, ajudaram a direcionar as ações de combate ao desmatamento e a reverter a tendência de aumento das queimadas.

Agora o número de focos de incêndio na região voltou a subir, e as notícias sobre o desmatamento na Amazônia se tornaram virais no mundo. Consequentemente, Morton e outros cientistas que estudam a Amazônia há anos ganharam os holofotes: estão atendendo pedidos da imprensa de todos os cantos do planeta, rebatendo a desinformação sobre as queimadas e lidando com suas próprias emoções a respeito do destino incerto da Amazônia.

"Recebi mais e-mails e mensagens no Facebook de meus parentes do que costumo receber em um ano inteiro", disse Michael Coe, diretor do Programa da Amazônia do Woods Hole Research Center. "Todos estão perguntando: 'O que está acontecendo? O que você está fazendo a respeito?'"

"Eu apenas expliquei para eles: é um ano ruim", disse Coe, e "é isso que acontece quando o desmatamento fica fora de controle".

Até o momento, houve mais de 80.000 incêndios em 2019, representando um aumento de mais de 80% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Ficou claro que o desmatamento explica o aumento do número de incêndios este ano.

E isso ocorre no primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro, defensor de uma maior abertura da Amazônia brasileira para o desenvolvimento. Em julho, quando os cientistas do INPE divulgaram dados preliminares mostrando um aumento no desmatamento, Bolsonaro chamou os dados de "mentira" e depois demitiu o diretor do INPE, o físico Ricardo Galvão. Mais recentemente, Bolsonaro tentou responsabilizar os membros de ONGs pelas queimadas. Por fim, em meio à crescente pressão internacional, Bolsonaro determinou o envio de tropas para ajudar no combate aos incêndios.

Esses episódios abalaram os pesquisadores da Amazônia.

Se as pessoas perderam a confiança nos principais centros de pesquisa e em seus alertas sobre desmatamento, "o futuro da Amazônia vai ser prejudicado", disse Paulo Brando, professor assistente da Universidade da Califórnia em Irvine e colaborador do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia). Brando passou cerca de 15 anos estudando a Floresta Amazônica e as mudanças climáticas.

Brando notou "muita confusão" sobre a magnitude dos incêndios — os incêndios deste ano são "muito graves", disse Brando, mas 2019 "não é o pior ano da história na extensão dos incêndios".

Embora o número de focos de fogo detectados na Amazônia brasileira seja superior ao de qualquer ano desde 2010, a situação era ainda pior no início dos anos 2000. O que mudou agora é que os pesquisadores estão mais bem equipados para rastrear os incêndios e medir o impacto da perda de florestas.

Os dados de satélite revolucionaram a maneira como os cientistas e a população em geral enxergam a Amazônia. "Passamos de mapas que diziam 'sem dados disponíveis' para fotos muito claras e atualizadas", disse Coe.

Os cientistas passaram a poder rastrear melhor o desmatamento, identificar onde ele estava localizado e com que rapidez estava ocorrendo e examinar inúmeros impactos ao clima e à biodiversidade. Alguns dos resultados foram alarmantes.

Por exemplo, agora os cientistas têm uma noção melhor de quão devastador para a Floresta Amazônica um único incêndio e incêndios repetidos podem ser. "Mesmo um único incêndio, de baixa intensidade, com chamas apenas até a altura dos joelhos, pode matar 80% das árvores em uma floresta", disse Morton.

Esses incêndios também têm um impacto climático significativo. A Floresta Amazônica é um dos maiores sumidouros de gases de efeito estufa, com suas árvores absorvendo emissões do ar. Mas quando essas árvores são derrubadas ou incendiadas, elas podem liberar algumas emissões de volta ao ar e reduzir a capacidade da floresta restante de diminuir essas emissões naturais.

"Depois de cinco incêndios sucessivos, uma floresta perde, em média, mais de 90% dos estoques de carbono", disse Danielle Rappaport, outra pesquisadora da NASA que trabalha com Morton.

"É um esforço constante tentar lidar com os vários fatores para que o desmatamento seja o menor possível", disse Coe. Portanto, ver um aumento no desmatamento nos últimos anos, e especialmente em 2019, "é um pouco frustrante", disse ele.

Coe acredita que melhor maneira de combater os desmatamentos é continuar a coletar dados sobre quem está incendiando a floresta e onde. "Vamos arregaçar as mangas e seguir em frente", disse. "Esse problema não vai desaparecer sozinho."


Este post foi traduzido do inglês.

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