Mulheres tomaram as ruas da Irlanda depois que a lingerie de uma adolescente foi exibida no julgamento que absolveu o homem acusado de estuprá-la.
Durante uma das audiências, a advogada de defesa, Elizabeth O’Connell, exibiu a calcinha que a adolescente de 17 anos estava usando no momento em que teria ocorrido o crime e disse ao júri: "Vocês tem que pensar em como ela estava vestida. Ela estava vestindo uma calcinha com frente de renda".
O homem de 27 anos foi inocentado da acusação de estupro da adolescente no início deste mês.
Os comentários de O’Connell, segundo o Irish Examiner e outros veículos, provocaram reações imediatas. O Dublin Rape Crisis Centre exigiu reformas legais para mudar a forma com que casos de estupro são julgados no país — ainda que não tenha questionado o veredito.
"Estes estereótipos sobre o estupro vivem surgindo nos processos judiciais, pois a defesa para o estupro é que o sexo foi consensual", disse a executiva-chefe do Rape Crisis, Noeline Blackwell, ao jornal Irish Independent. "Então, qualquer coisa que o réu puder fazer para sugerir que houve consentimento será usado."
Nesta quarta-feira (14), mulheres se reuniram em toda a Irlanda para protestar sobre a condução do processo judicial.
As manifestações ocorreram após a viralização da campanha #ThisIsNotConsent [#istonãoéconsentimento]. "Resumindo, roupa não é consentimento. Este tipo de culpabilização da vítima é arcaico e não deve ter lugar em nosso sistema judicial", disse Susan Dillon, que lançou a hashtag, ao BuzzFeed News.
Dillon, de 40 anos, ficou surpresa com a reação nas redes sociais à campanha. "Sabíamos que as pessoas seriam solidárias e iriam querer apoiar as sobreviventes de violência sexual, mas ficamos impressionadas."
Nos dias seguintes ao julgamento, centenas de mulheres tuitaram imagens de suas calcinhas e questionaram como a visão sobre o consentimento no país já é ultrapassada.
Muitas tuitaram o desenho de uma calcinha, apontando que a escolha sobre suas roupas íntimas não deveria ser um fator para decidir se há ou não consentimento sexual.
Outras mulheres expressaram sua revolta sobre a dificuldade para levar um caso de estupro a julgamento na Irlanda.
A campanha chegou ao Dáil (a versão irlandesa da Câmara dos Deputados). Com uma calcinha nas mãos, a congressista Ruth Coppinger disse: "Pode parecer constrangedor mostrar essa calcinha aqui, mas como vocês acham que a vítima de um estupro ou uma mulher se sente quando sua calcinha é exibida em um tribunal?"
Não é a primeira vez que a Irlanda debate o consentimento sexual. No início deste ano, a hashtag #IBelieveHer [#EuAcreditoNela] viralizou no país após dois jogadores de rúgbi acusados de estupro serem absolvidos.
Recentemente, uma pesquisa mostrou que, no país, ainda que os relatos de assédio sexual tenham triplicado nos últimos 18 anos, menos de 2% desses casos chegam a ser condenados nos tribunais.
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A tradução deste post (versão original em inglês) foi editada por Luísa Pessoa