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A Amazon tem um enorme e rentável mercado de fraude de avaliações

Uma vasta rede de fraude de avaliações da Amazon está on-line e foi planejada para evitar os esforços da empresa de impedi-la.

Em uma manhã no final de janeiro, Jake pegou a caixa na sua mesa, rasgou a fita da embalagem, retirou a capinha de iPhone de dentro, tirou uma foto e a carregou para uma avaliação da Amazon que ele estava escrevendo. A avaliação incluía uma frase sobre o design elegante da capinha e os botões de volume claros e legais. Ele terminou a sinopse com um título chamativo (“The perfect case!!”, ou "A capinha perfeita!!") e avaliou o produto com cinco estrelas. Clicou. Enviou.

Jake nunca experimentou a capinha. Ele nem mesmo tem um iPhone.

Jake, então, copiou o link da sua avaliação e o colou em um canal do software de comunicação Slack exclusivo para convidados para avaliadores pagos da Amazon. Um dia depois, ele recebeu uma notificação do PayPal, alertando-o sobre um novo crédito em sua conta: um reembolso de US$ 10 pelo celular que ele nunca vai usar, juntamente com US$ 3 pelo seu trabalho — potencialmente mais, se ele puder revender a capinha de iPhone.

Jake não é o seu nome verdadeiro. Ele — juntamente com os outros quatro avaliadores que falaram com o BuzzFeed News para esta reportagem — quis permanecer anônimo com medo de que a Amazon banisse sua conta. Eles fazem parte de uma força de trabalho extensa e invisível que alimenta um mercado de fraude de avaliações que persiste em todos os cantos do maior mercado da internet.

Atraídos pelo dinheiro fácil e coisas grátis, esses avaliadores têm inundado a Amazon com falsos reviews de cinco estrelas para luzes de LED, tigelas para cães, roupas e até itens de saúde, como vitaminas pré-natais — tudo para convencê-lo de que aquele produto é o melhor e reforçar as vendas de especuladores na esperança de tirarem uma casquinha da Corrida do Ouro da Amazon.

Enquanto isso, vendedores que tentam agir de acordo com as regras estão lutando para se manterem no mercado em meio a um mar de avaliações fraudulentas, e os compradores inadvertidamente estão comprando produtos inferiores ou simplesmente defeituosos. E a Amazon é praticamente impotente para impedir isso.

Os sistemas que criam avaliações fraudulentas são uma teia de subreddits complicada, canais do Slack apenas para convidados, servidores do Discord privados e grupos fechados do Facebook, mas os incentivos são simples: ser um produto cinco estrelas é crucial para a venda de estoques em escala no mercado intensamente competitivo da Amazon — tão crucial que os vendedores estão dispostos a pagar milhares de pessoas para avaliarem seus produtos de forma positiva.

Avaliada em pouco mais de US$ 760 bilhões, a Amazon é a segunda empresa mais valiosa do mundo, atrás da Apple. O diretor executivo Jeff Bezos revelou recentemente que a empresa tem, no mundo todo, mais de 100 milhões de membros pagantes da Amazon Prime, a assinatura de US$ 119 por ano que oferece aos assinantes — os clientes mais dedicados da Amazon — envios gratuitos, streaming de música, TV e filmes, acesso a uma biblioteca de livros eletrônicos, entre outras coisas.

A empresa opera 13 mercados de vendedores terceirizados em todo o mundo e aluga espaço para abrigar os estoques desses vendedores em mais de 150 armazéns. Em 2017, os vendedores terceirizados arrecadaram US$ 32 bilhões em receita, e cerca de 300 mil novos vendedores ingressaram no mercado somente no ano passado.

A melhor maneira de vender na Amazon é com avaliações positivas, e a melhor maneira de obter avaliações positivas é comprando-as. 

As avaliações são a melhor maneira de o comprador navegar neste mercado estonteante lotado de produtos, e a chance de o vendedor se destacar da multidão. Em uma pesquisa de 2011, 87% dos consumidores disseram que uma avaliação positiva confirmou sua decisão de comprar um produto; as avaliações de clientes on-line são a segunda fonte mais confiável de informações sobre os produtos, atrás de recomendações de familiares e amigos. Mas apenas de 3% a 10% dos clientes deixam avaliações. A melhor maneira de vender na Amazon é com avaliações positivas, e a melhor maneira de obter avaliações positivas é comprando-as.

Em outubro de 2016, a Amazon baniu itens gratuitos ou descontos em troca de avaliações facilitados por terceiros. Mas Tommy Noonan, diretor executivo do ReviewMeta, um site que analisa anúncios da Amazon, disse que o que ele chama de "avaliações não naturais" — ou seja, avaliações que seu algoritmo indica serem falsas — retornaram à plataforma. Em junho de 2017, Noonan notou um aumento nas avaliações não naturais, juntamente com um aumento na avaliação média dos produtos, e a taxa de aumento não diminuiu desde então.

A proibição da Amazon não impediu os vendedores de recrutarem avaliadores. Isso apenas tornou a prática clandestina. Os avaliadores não são mais simplesmente incentivados com produtos gratuitos — eles são comissionados especificamente por uma avaliação de cinco estrelas em troca de dinheiro. As avaliações negativas também são mais difíceis de detectar: elas não contêm nenhuma divulgação (pois as avaliações incentivadas são proibidas, e uma divulgação indicaria que a avaliação viola os termos da Amazon). Os avaliadores pagos também costumam pagar por produtos com seus próprios cartões de crédito em suas próprias contas na Amazon, com as quais gastaram pelo menos US$ 50, tudo para atender aos critérios de uma "compra verificada", de modo que suas avaliações sejam marcadas como tal.

A Amazon não revela quantas avaliações — fraudulentas ou totais — ela têm. Mas com base em sua análise dos dados da Amazon, Noonan estima que a Amazon tenha cerca de 250 milhões de avaliações. O site de Noonan coletou 58,5 milhões dessas avaliações, e o algoritmo do ReviewMeta identificou 9,1%, ou 5,3 milhões das avaliações do conjunto de dados, como “não naturais”.

Uma porta-voz da Amazon disse ao BuzzFeed News que a porcentagem de avaliações não autênticas na plataforma é "pequena", mas não foi mais específica. Em um comunicado, ela escreveu: “A Amazon está investindo pesadamente para detectar e evitar avaliações não autênticas. Além da detecção avançada, usamos um algoritmo que dá mais peso às avaliações mais recentes e úteis, aplica critérios rígidos para qualificar com o selo de compra verificada pela Amazon e requisita um valor significativo em dólares para participar”.

Investigadores internos também examinam avaliações e "fóruns não relacionados à Amazon" usados para avaliações de compras, disse a porta-voz. A Amazon diz que bloqueia ou suspende contas pertencentes a qualquer uma das partes envolvidas.

Mas conversas com vendedores, clientes e avaliadores revelam que o abuso das avaliações continua, apesar dos esforços da empresa.

Uma avaliação não natural não significa necessariamente que um produto seja inferior. Mas o problema com as avaliações pagas é que elas dificultam para os consumidores — mesmo os mais experientes — saber se o que estão comprando é realmente bom ou ruim.

Em dezembro, Kevin Votaw, de Fort Collins, Colorado, comprou um protetor de tela do Samsung Galaxy S8 por US$ 10, usando a conta Amazon Prime da sua namorada.

Ele era, ele disse, "horrível": o material era tão grosso que ele não conseguia digitar, tornando o produto completamente inutilizável. Frustrado, Votaw pediu à Amazon um reembolso pelo produto não retornável, que tem um adesivo grudento e não pode ser reutilizado. "Eu voltei ao anúncio, pensando: 'Certamente todas essas avaliações estão erradas'", disse ele. Mas o produto não estava disponível — "como se a empresa estivesse lançando esses protetores em lotes e, em seguida, retirando-os da Amazon".

A Amazon removeu o anúncio do protetor de tela após uma investigação do BuzzFeed News, mas outros dois anúncios com fotos quase idênticas do produto têm mais de 550 e 150 avaliações cada um, os quais incluem uma avaliação de cinco estrelas e não são verificados.

Desde então, Votaw encontrou um protetor com uma avaliação mediana de 3,5 estrelas com o qual está satisfeito: "Ele funciona perfeitamente", disse ele. "Deixarei uma ótima avaliação."

Digite "Amazon Review" na caixa de pesquisa do Facebook, e mais de cem grupos aparecerão. Dois dos grupos mais populares, Amazon Review Club e US - Amazon Review Club, com 69 mil e 60 mil membros, respectivamente, foram encerrados recentemente, mas muitos outros grupos permanecem, com dezenas de milhares de membros cada.

As publicações dos grupos são como a venda de garagem mais aleatória de todos os tempos: removedores de fiapos, absorventes de fraldas, brinquedos sexuais. Novos produtos são adicionados a cada minuto. A maioria dos vendedores é chinesa; em fevereiro, os membros do grupo foram avisados de que as festividades do calendário lunar chinês poderiam desacelerar os pagamentos. As publicações incluem uma foto do produto com uma descrição que diz "reembolso do PP após a avaliação", o que significa que as partes interessadas receberão um pagamento do PayPal após a comprovação de que publicaram uma avaliação.

Um produto listado no grupo, um corretor de postura projetado para alinhar as costas ao sentar, estava oferecendo uma comissão extraordinariamente alta: um vale-presente de US$ 30 da Amazon que incluía US$ 20 para o produto e US$ 10 adicionais para o avaliador, que precisava ser membro da Amazon Prime e escrever uma avaliação contendo imagens.

Enquanto isso, o subreddit de 36.629 membros /r/slavelabour, que se dedica a fazer “trabalhos bem feitos abaixo do valor do mercado”, tem um processo formalizado para publicar oportunidades para possíveis avaliadores da Amazon.

Os vendedores postam "tarefas" que incluem deixar avaliações positivas sobre seus produtos — ou avaliações de uma estrela nos produtos dos concorrentes. Um anúncio dizia: "As avaliações não precisam ser verificadas nem nada, então a tarefa não levará mais que um minuto do seu tempo. Vou lhe enviar o link do produto, você vai e deixa uma breve avaliação de 1 estrela, e é isso. Pagarei US$ 5 a você através do Paypal assim que a avaliação aparecer na Amazon”. Em uma semana, 27 usuários haviam dado “lances” na tarefa, expressando seu interesse.

Os avaliadores mais ativos tornam-se "caça-talentos", trabalhando para recrutar usuários do /r/slavelabour em servidores privados do Discord ou canais do Slack dedicados unicamente a alimentar o ecossistema de avaliações da Amazon.

Os vendedores geralmente pagam entre US$ 4 e US$ 5 por avaliação, além de um reembolso do produto. Os moderadores recebem uma parte — cerca de 20% a 25% para o servidor do Discord ao qual eu tive acesso, mas os avaliadores conseguem ficar com o item de graça.

No dia 13 de janeiro, o moderador do servidor publicou uma convocação para avaliadores interessados no “Before You Go To the Toilet Poop Spray”, um desodorante natural contendo o “perfume da Austrália”, de uma empresa chamada Veil.

O anúncio do spray para cocô mostra várias avaliações negativas, seguidas de uma série de avaliações mais positivas publicadas depois de 13 de janeiro. Ambas as avaliações positivas e negativas são "compras verificadas", tornando quase impossível diferenciar entre avaliações comissionadas e genuínas. Nenhuma das avaliações contém uma divulgação de que o produto foi recebido gratuitamente ou que a avaliação foi paga pelo vendedor.

Em um e-mail para o BuzzFeed News, Greg Doney, representante da Veil Fragrances, reconheceu que a empresa pagou pelas avaliações, "mas você tem que fazer isso, pois é realmente difícil lançar um produto sem elas".

Quando você analisa mais de perto o histórico de avaliações de produtos dos clientes do spray para cocô, surge um padrão. Além do spray para cocô, os clientes da Amazon “Brian” e “Sharon” também deram a um suporte de prateleira flutuante, que havia sido publicado no servidor do Discord anteriormente, notas altas.

Brian disse que o produto era uma “prateleira realmente resistente” (é um suporte, não uma prateleira); e Sharon observou que eles são "fáceis de montar" e "duráveis". As avaliações críticas, enquanto isso, avisam os clientes com "NÃO COMPRE!" e "ENORME desperdício de dinheiro", citando danos na parede e suportes mal feitos (a empresa de prateleiras não respondeu a um pedido de comentário do BuzzFeed News enviado ao seu perfil de vendedor da Amazon).

As mesmas contas também avaliaram "supositórios de ácido bórico" para saúde vaginal. Os suplementos devem ser inseridos na vagina duas vezes ao dia por duas semanas, de acordo com o rótulo do produto. Ele tem a finalidade de fornecer "suporte de saúde vaginal" e "alívio de odor, coceira, dor, ardência e irritação". As cápsulas foram postadas no servidor do Discord em 22 de janeiro — e as avaliações de Brian e Sharon apareceram pouco depois disso.

Brian comentou que sua namorada estava "tendo dor durante o sexo e não era por minha causa", e os suplementos a curaram. Sharon mencionou que era a "melhor e mais barata" opção para a higiene e saúde feminina. Nenhuma das avaliações estava marcada como compras verificadas. Uma avaliação de cinco estrelas de D. Pham diz até que o ácido bórico “não tem um gosto ruim”, mesmo que a pílula não seja tomada oralmente (D. Pham também deu cinco estrelas para o suporte de prateleira flutuante).

Enquanto isso, uma avaliação de uma estrela dizia que o produto era um “pesadelo”, citando como a pílula “parece uma mistura de cimento na minha vagina”. Outra dizia que o supositório causou “uma sensação de ardência irritante que durou horas”. A empresa não respondeu a um pedido de comentário.

De acordo com Jenny Jaque, professora assistente de ginecologia da Escola de Medicina Keck da Universidade do Sul da Califórnia, os supositórios de ácido bórico só devem ser usados sob certas circunstâncias e sob a supervisão de um médico. "O ácido bórico não é um doce, e você precisa ter cuidado", disse ela. “Ele pode causar irritação: sua vagina vai doer; você sentiria uma dor como se sua vagina estivesse queimando." Ela acrescentou que "ele é realmente tóxico se ingerido por acidente".

O servidor do Discord publicou recentemente vitaminas de curcumina de açafrão, bem como cápsulas de mioinositol, feitas pela mesma marca, listadas na categoria de vitaminas pré-natais. Os mesmos avaliadores — Sharon e D. Pham — deram cinco estrelas às vitaminas pré-natais. Ambas as avaliações estavam marcadas como compras verificadas. A empresa não respondeu a um pedido de comentário.

A Amazon disse que tem aplicado critérios mais rígidos para deixar avaliações de compra verificada. Avaliadores dos EUA devem ter uma conta protegida por senha e ter feito pelo menos US$ 50 em compras na Amazon com um cartão de crédito válido.


Durante um verão quente em 2010, Jamie Whaley descobriu um problema com seus lençóis de elástico: eles estavam se soltando e acabando enrolados nos tornozelos do seu marido Jimmy.

Whaley, então uma estudante de enfermagem de 40 anos do Texas, saiu em busca de uma solução. Os lençóis mais antigos tinham prendedores do tipo suspensório que eram muito incômodos, então Whaley desenvolveu os seus próprios, usando um cabo de energia para fazer um mecanismo de aperto fácil ativado por botão. Ela chamou sua nova invenção de BedBand.

Jimmy Whaley convenceu sua esposa a começar a vender BedBands na Amazon. O produto funcionou e as pessoas queriam comprá-lo: nos anos seguintes, o BedBand se tornou o prendedor de lençóis mais vendido da Amazon, com mais de US$ 700 mil em vendas anuais.

Então, em outubro de 2014, a receita do BedBand foi subitamente reduzida à metade, para cerca de US$ 350 mil. Whaley, que havia desistido da carreira de enfermagem, e Jim, que também se juntou à empresa em tempo integral como diretor de operações, ficaram arrasados. "Alguém estava vendendo uma réplica exata do nosso produto e não podíamos usar nossa patente porque ela estava pendente", disse Whaley.

As falsificações, vendidas em massa no AliExpress, inundaram o mercado de prendedores de lençóis da Amazon, e muitas delas receberam dezenas de avaliações de cinco estrelas muito rapidamente. Nos oito meses seguintes, as vendas despencaram. “Foi triste”, disse Whaley. "Nós nos perguntamos se era hora de procurar empregos diferentes." Ela foi forçada a demitir oito contratados, metade de sua equipe na época.

"Isso é estressante, sabendo que a Amazon é a nossa grande loja."

A Amazon retirou as falsificações assim que o BedBand recebeu uma patente; isso foi um ano depois que as vendas começaram a cair, mas já era tarde demais. A patente não impediu que os concorrentes deixassem avaliações negativas de uma estrela nos anúncios do BedBand: "Você começa a procurar um pouco mais... e pode ver que eles deixaram avaliações de cinco estrelas para nossos concorrentes. Ou você verá que dois compradores diferentes avaliaram o mesmo tipo de produto, os produtos dos nossos concorrentes”, afirmou Whaley.

O BedBand é atualmente o prendedor mais vendido, mas isso pode não ser por muito tempo. "Isso é estressante, sabendo que a Amazon é a nossa grande loja", disse ela. Para diversificar a receita, Whaley começou a vender BedBands no Walmart.com, Jet.com, Sears.com e outros varejistas.

Whaley foi cuidadosa ao falar da Amazon, sua principal fonte de renda: "Eu não quero causar problemas onde estou estabelecida", disse ela — mas parecia desconfortável por estar à mercê dos algoritmos da Amazon. "Em alguns dias, de repente somos quinto. Quando você vê uma mudança rápida como essa e [nossos concorrentes] acabam com avaliações de repente, é frustrante. Você simplesmente não sabe se amanhã esses concorrentes vão derrubar nossas vendas.”

Escrever avaliações pagas é a barraca de limonada moderna. De acordo com as pessoas que fazem isso, é uma maneira rápida e fácil de ganhar alguns trocados e conseguir produtos gratuitos — mas não uma carreira. E como os lances, a escrita e a transação acontecem on-line, tudo pode ser feito em um notebook no seu quarto.

Muitos avaliadores que falaram com o BuzzFeed News são homens no final da adolescência ou com vinte e poucos anos que viram a atividade como um passatempo. Todos quiseram permanecer anônimos, com medo de serem pegos pela Amazon, o que normalmente resulta em revogação dos privilégios de avaliação ou, nos casos mais graves, em proibição de reutilizar o mesmo endereço de entrega ou forma de pagamento com uma nova conta.

Josh (nome fictício) é relativamente novo em avaliar; ele descobriu isso por meio do /r/slavelabour. Ele disse que está nisso pelos produtos: "Você consegue ficar com o produto, então isso é uma vantagem. Na minha opinião, é interessante testar produtos novos e exclusivos”.

Os avaliadores pagos mais diligentes tornam-se moderadores e começam a facilitar os acordos de avaliação. Frank, cujo nome foi mudado, gerencia um canal do Slack de avaliações da Amazon no seu tempo livre. O empreendedor de 18 anos vasculha a Amazon em busca de produtos que não são bem avaliados e oferece ao vendedor do produto os serviços de avaliação do seu canal do Slack. Anúncios com um pequeno número de avaliações e notas baixas são os candidatos ideais. "Se [um anúncio de produto] tem 30 avaliações com uma média de 2,5 estrelas, vale a pena e eu entrarei em contato", disse ele.

Frank ganha apenas cerca de US$ 20 de avaliações por mês, e às vezes um pouco mais por meio de negociações com os vendedores. "Eu recebo cerca de 30% para cada avaliação de um dos nossos avaliadores", disse ele. A maior parte da receita das avaliações de Frank vem da revenda dos itens que ele avalia no eBay, onde ele faz "cerca de US$ 200" por mês.

Outro avaliador, a quem chamaremos de Evan, faz parte de um canal privado do Slack de 10 pessoas e fatura cerca de US$ 75 por mês. Ele escreveu mais de 150 avaliações para itens como coletes de treino com peso, pílulas para crescimento de cabelo em 30 dias e carregadores de telefone para carro.

"É ótimo para pequenos investimentos e economias", disse ele. Para escrever suas avaliações comissionadas, Evan se inspira em avaliações já existentes, "depois eu reorganizo algumas palavras-chave".

Um avaliador, Devan, que pediu para ser identificado apenas pelo primeiro nome, nega qualquer irregularidade. O estudante universitário jura que ele não oferece nada além de sua opinião sincera e acha que as avaliações incentivadas da Amazon não são uma farsa. Ele não sabia que avaliações incentivadas violavam os termos de serviço da Amazon até o BuzzFeed News lhe dizer.

Ele admitiu que se beneficia das avaliações incentivadas (as quais ele escreve diariamente): ele reutiliza o plástico-bolha e outros materiais de envio da Amazon para seus negócios no eBay, pelos quais ele revende itens comprados em oferta.

Mas as avaliações incentivadas na Amazon, diz ele, são apenas uma evolução das táticas de marketing que existem há muito tempo. “Em um evento esportivo, a Mountain Dew distribuirá refrigerante de graça, e, se as pessoas gostarem, elas postarão nas mídias sociais ou qualquer outra coisa. É meio que a mesma coisa, e como no Walmart, onde você recebe amostras grátis”, disse Devan.

“Alguns desses vendedores são lojas independentes e familiares, e muitas empresas querem apenas o seu feedback sincero... Eu conheço muitas pessoas [que avaliam] que não estão nisso pelo dinheiro. Elas estão apenas tentando encontrar produtos melhores para as pessoas”, disse Devan.

Devan está certo — há "lojas familiares e independentes" na Amazon, como o negócio do BedBand da Whaley. Mas cada vez mais os vendedores são pessoas com pouca experiência em comércio eletrônico ou experiência em produtos, procurando tirar vantagem dos milhões de clientes da Amazon — e eles precisam de avaliações altas para suplantarem o melhor vendedor existente.


Por meio do programa “Amazon FBA”, ou “Fulfillment by Amazon”, qualquer um pode abrir sua própria vitrine na Amazon. É fácil: compre produtos em massa de um fornecedor atacadista on-line, como o AliExpress, e envie o inventário para um dos depósitos da Amazon, onde a Amazon cuidará de todos os aspectos da distribuição, desde o pagamento até o envio do pedido.

David, cujo nome foi alterado, é um vendedor do FBA que considerou comprar avaliações de cinco estrelas. "Parece que as pessoas que ganham mais dinheiro são aquelas que violam os termos de serviço da Amazon", disse ele.

David não inventou nada. Ele não foi para a escola de medicina. Mas ele ganha cerca de US$ 1.000 por mês vendendo esponjas de treinamento de suturas para profissionais da área médica na Amazon. “É um passatempo, como jogos de videogame. Além disso, Warren Buffett disse algo do tipo: 'Se você quer ganhar dinheiro, precisa praticar ganhar dinheiro"'.

“É um passatempo, como jogos de videogame. Além disso, Warren Buffett disse algo do tipo: 'Se você quer ganhar dinheiro, precisa praticar ganhar dinheiro."'

David começou a usar um site chamado Jungle Scout. Uma assinatura, que custa cerca de US$ 350 por ano, fornece métricas que mostram quais produtos os clientes da Amazon estão comprando muito — e apresenta categorias em que o principal vendedor tem uma classificação de estrelas baixa ou média. Essa classificação por estrela medíocre indica que há uma oportunidade no mercado para outro vendedor ganhar alguns dos clientes desse produto de baixa classificação.

“O que eu encontrei foram esponjas de sutura, como uma pele de simulação para estudantes de medicina. Então eu fui no Alibaba. Todos os fornecedores chineses estão lá e eles atendem pedidos em massa.”

David — e outros vendedores do FBA como ele — invadiu o mercado de esponjas de sutura da Amazon. "O cara original, o cara cujo produto foi apresentado no Jungle Scout, começou a perder muitas vendas por causa de toda a competição", disse ele. Ficou claro, de acordo com David, que o vendedor, a Your Design Medical, estava deixando avaliações de uma e duas estrelas nos produtos dos concorrentes (a Amazon disse que, após uma investigação, não considerou a Your Design Medical culpada de abuso de avaliações. A Your Design Medical não respondeu a uma solicitação de comentário do BuzzFeed News enviada para seu endereço de e-mail de suporte ao cliente).

O único vendedor novo com bom desempenho, apesar das avaliações negativas do vendedor original, também estava, na opinião de David, "enganando o sistema". “O anúncio tinha 33 avaliações de cinco estrelas. Não há como obter 33 avaliações em dois meses. Isso é incomum para um produto como esse”, disse ele.

Por fim, David não acabou comprando avaliações, mas acrescentou: "Se eu realmente precisasse da FBA para minha renda, eu teria feito isso".

Muitos avaliadores compensados, e os vendedores que os contratam, não se veem como mal-intencionados. Eles são apenas um dos milhares de outros avaliadores e vendedores fazendo exatamente a mesma coisa. Tomar atalhos, eles dizem, é apenas nivelar o campo de jogo. Dentro do imenso mercado da Amazon, há muitos lugares para se esconder, otimizar, trapacear — e, como os vendedores não podem controlar os algoritmos, eles fazem tudo o que podem para influenciá-los.

A Amazon tem tentado reprimir a fraude de avaliações em sua plataforma. A empresa processou mais de 1.000 pessoas por escrever ou vender avaliações falsas. Em seu processo de 2015 contra freelancers no site do Fiverr, a Amazon disse que "leva a sério a credibilidade de seus clientes", e também afirmou que "embora pequenas em número, essas avaliações podem minar significativamente a confiança que consumidores e a grande maioria dos vendedores e fabricantes depositam na Amazon, o que por sua vez mancha a marca da Amazon”.

Em suas diretrizes de mercado para os vendedores, fornecidas ao BuzzFeed News por um vendedor terceirizado, a Amazon diz que os vendedores "não podem oferecer compensação por uma avaliação e você não pode avaliar seus próprios produtos ou os produtos de seus concorrentes". Os vendedores podem "pedir aos compradores que escrevam uma avaliação de uma maneira neutra", sem pedir especificamente avaliações positivas, ou "pedir que os avaliadores alterem ou removam suas avaliações". E, no entanto, todos esses comportamentos persistem.

Sam Feldman começou a vender o CardBuddy, uma carteira para celulares, na Amazon, como estudante universitário. O CardBuddy foi o primeiro produto de couro desse tipo na Amazon, mas Feldman não tinha uma patente. Os concorrentes copiaram rapidamente o produto, sua embalagem e até usaram as fotos do CardBuddy. Um vendedor recebeu 500 avaliações em dois meses. De acordo com Feldman, as avaliações eram “claramente falsas”.

"Um dia, minhas vendas foram cortadas pela metade, e isso foi muito desconcertante", disse Feldman ao BuzzFeed News. “Ficou assim para sempre. Veio mais concorrência, e talvez ela tivesse fotos ou títulos melhores… mas eu não sei”, disse ele.

Um porta-voz da Amazon disse: “Encorajamos os detentores de direitos que têm preocupações com a autenticidade do produto que nos notifiquem; investigamos completamente todas as solicitações. Removemos itens suspeitos de falsificação conforme tomamos conhecimento deles, e removemos permanentemente agentes mal-intencionados de venderem na Amazon”. Feldman diz que a empresa prontamente retirou o anúncio com falsificação e marcou o CardBuddy como detentor dos direitos autorais de suas próprias fotos. Mas, de acordo com Feldman, demorou alguns meses para a Amazon remover as centenas de avaliações falsas.

Feldman acha que a Amazon poderia fazer mais para combater a fraudulência na plataforma: “Por um lado, a Amazon começou esse negócio e está convidando as pessoas para venderem em seu site. A Amazon está prestando atenção no sistema como um todo, e não em mim, que é como eu vejo. Mas, ao mesmo tempo, o que você faz quando alguém está ganhando a vida com isso?”.

Parar as avaliações falsas é complicado para a Amazon. Ao fazer isso, a empresa corre o risco de alienar os vendedores, parte essencial de seus negócios. Em 2017, mais da metade das unidades vendidas na Amazon em todo o mundo eram de terceiros, e mais de 140 mil do que a Amazon define como “pequenas e médias empresas” superaram US$ 100 mil em vendas. A empresa gera receita não apenas com a hospedagem de anúncios de produtos, mas com cada venda feita através do site, com taxas de atendimento com base no peso de cada pedido de envio e com o uso de imóveis de armazenamento em seus centros de atendimento. A receita dos serviços de vendedores foi responsável por US$ 23 bilhões em 2016.

A Amazon é o lugar certo para os vendedores de comércio eletrônico, e é cada vez mais vista como uma utilidade. Em 2017, a Amazon foi responsável por quase metade de todas as vendas de comércio eletrônico nos EUA (44%), com US$ 196,8 bilhões em vendas.

“A Amazon realmente é... é um ótimo site, mas por mais que as avaliações falsas sejam publicadas na internet, eu não sei como alguém pode bater de frente com elas. Os trapaceiros sempre vão trapacear".

Como os empreendedores durante o boom dos "pontocom", as pessoas estão correndo para vender na Amazon, e sites como o AliExpress facilitam a aquisição de enormes quantidades de estoque (o AliExpress ainda tem seu próprio programa de atendimento). Essa corrida — que inclui a aquisição de avaliações positivas para chegar ao topo dos algoritmos de busca da Amazon para vender esse inventário o mais rápido possível — pode afastar os vendedores que estão menos sintonizados com a velocidade e a desumanidade dos algoritmos da plataforma, e como eles podem ser punitivos, como resultado.

A empresa, por meio de ações judiciais, moderadores humanos e algoritmos, está tentando manter as avaliações falsas fora do site, mas as indústrias de avaliações que produzem essas classificações falsas podem estar sempre um passo à frente da capacidade da Amazon de moderá-las.

Assim como o Twitter, o Facebook e o Google, a Amazon decidiu criar uma plataforma neutra e convidou a internet para fazer algo. Mas, assim como o Twitter, o Facebook e o Google, a Amazon permitiu que sua plataforma fosse grande e abrangente — e crescesse muito além de seu controle. Mas a diferença entre a Amazon e, digamos, o Twitter, é que a subsistência de seus usuários depende do anterior.

Enquanto isso, os clientes da Amazon — deixados no escuro sobre a mecânica sofisticada por trás das avaliações aparentemente genuínas que orientam suas decisões de compra — continuam comprando produtos de qualidade inferior que não atendem às suas expectativas.

Whaley parou por um tempo quando perguntada o que mais a Amazon poderia fazer para manter as avaliações fora da plataforma. “As avaliações falsas e as vendas estão muito interligadas agora. Eu não sei como eles podem se livrar disso. Acho que não há esperança. O processo de avaliações era incrível quando começou, mas agora está muito corrompido", disse ela.

Com um grande suspiro, Whaley continuou: “A Amazon realmente é... é um ótimo site, mas por mais que as avaliações falsas sejam publicadas na internet, eu não sei como alguém pode bater de frente com elas. Os trapaceiros sempre vão trapacear". ●

CORRECTION

The story has been updated to clarify that there are 58.5 million reviews in ReviewMeta's dataset, of which 9.1% (or 5.3 million) have been identified as "unnatural." An earlier version of this story misstated the number of reviews in ReviewMeta’s dataset.


Este post foi traduzido do inglês.

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