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É assim que a Arábia Saudita tem abalado o Oriente Médio

A tensão aumentou na região após a renúncia repentina do primeiro-ministro do Líbano, Saad Hariri, e um expurgo extraordinário de membros da família real — incluindo um príncipe bilionário — na Arábia Saudita.

BEIRUTE — Um importante membro da realeza saudita morreu em um acidente aéreo no domingo (5), um dia após a renúncia do primeiro-ministro do Líbano e um expurgo sem precedentes de líderes empresariais, militares e governamentais da Arábia Saudita. Os acontecimentos abalaram o Oriente Médio, com diplomatas, políticos e analistas se esforçando para determinar sua importância.

A tensão entre o Irã e a Arábia Saudita aumentou com a renúncia, no sábado (4), de Saad Hariri, primeiro-ministro libanês, um dos principais aliados do governo saudita, mergulhando no caos o governo do Líbano. Horas depois, mais de uma dúzia de potenciais rivais do jovem príncipe herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, estavam sendo presos ou demitidos sob acusações de corrupção — no que os analistas viram como uma jogada do rei Salman para consolidar o poder nas mãos do filho e eliminar adversários e críticos.

Um acidente de helicóptero perto da fronteira do Iêmen matou o príncipe Mansour bin Muqrin bin Abdulaziz, filho do ex-rival de Bin Salman, e encerrou 48 horas tumultuadas e tensas nos assuntos sauditas. Pelo menos meia dúzia de outras pessoas morreram no acidente, que foi reportado por agências de notícias oficiais sauditas.

Aumentando as tensões regionais, aliados de Teerã no Iêmen dispararam um míssil, no sábado (4), no principal aeroporto internacional de Riad. O míssil foi interceptado, segundo a Arábia Saudita. No domingo (5), a coalizão liderada pelos sauditas disse que havia fechado os portos terrestres, marítimos e aéreos do Iêmen. Isso ocorreu horas após Riad emitir uma lista de 40 nomes de supostos líderes da minoria houthi e publicar recompensas de milhões de dólares por informações que levem à sua captura.

As jogadas da liderança saudita ilustraram a mudança dramática que o reino sofreu, passando de uma força sonolenta e conservadora sob o domínio do rei Abdullah, que morreu há dois anos, para um poder regional mais imprevisível e potencialmente desestabilizador sob o domínio de Salman e seu filho e herdeiro de 32 anos, Mohammed, popularmente conhecido por suas iniciais, MbS, que foi nomeado Príncipe Herdeiro em junho.

"MbS será rei por 50 — repito, 50 — anos", escreveu no Twitter Aaron David Miller, ex-negociador de democratas e republicanos no Oriente Médio. "Esperemos que sua imprudência no exterior e sua arbitrariedade em casa sejam temperadas pela sabedoria."

O príncipe herdeiro apresentou um plano ambicioso, incluindo modernizar a versão rigorosa do Islã na Arábia Saudita, afastar sua economia dependente do petróleo das receitas petroquímicas e confrontar mais fortemente a influência iraniana no Oriente Médio.

Entre os presos está Alwaleed Bin Talal, o bilionário proprietário do Kingdom Holding Group, um investidor muito conhecido que também apoiou a abertura da economia e da sociedade saudita e tem fortes laços com Washington. Vários executivos de mídia de alto escalão e antigos e atuais funcionários do governo também foram presos ou demitidos, incluindo o chefe da marinha da Arábia Saudita, o chefe da guarda nacional e o ministro da economia e do planejamento. Acredita-se que muitos dos membros da realeza presos estavam hospedados no glamouroso Ritz-Carlton Hotel, onde os hóspedes receberam ordens para sair imediatamente. As suítes no hotel custam entre US$ 1.000 e US$ 4.000 por noite.

O reino descreveu as prisões e demissões como parte de uma campanha anticorrupção, liderada pelo príncipe herdeiro, destinada a eliminar a "exploração de algumas das almas fracas que colocaram seus próprios interesses acima do interesse público". No entanto, observadores sauditas estão céticos.

"Com as prisões, as autoridades sauditas continuam uma tendência que temos visto nos últimos meses — consolidação, consolidação, consolidação", disse H.A. Hellyer, estudioso do Atlantic Council e do Royal United Services Institute. "O que torna isso incomum é a velocidade com a qual aconteceu. Mas a mensagem é clara. As autoridades querem que todos saibam que elas têm uma direção em especial que pretendem seguir. Precisamente qual é essa direção, no entanto, permanece um pouco obscuro."

As detenções e demissões seguem uma "onda de prisões anteriores de dezenas de estudiosos, juízes e intelectuais islâmicos cujos pontos de vista vão do ultraconservador ao liberal", escreveu James Dorsey, membro sênior da Rajaratnam School of International Studies, em Singapura. Elas vêm em meio à guerra em andamento dos sauditas contra os houthis no Iêmen e confrontam a monarquia do Catar, a qual Riad e seus aliados instauraram um bloqueio desde junho devido à sua política externa de mentalidade independente.

Alguns analistas especularam que a repressão pode ser um prelúdio para uma tentativa mais ampla de conter eventuais protestos antes da tentativa de implementar à força o plano doméstico do príncipe herdeiro.

"Este é o mais recente ato de concentração de poder na Arábia Saudita", disse Hasnain Malik, analista de ações da Exotix Capital, em nota enviada por e-mail para clientes e jornalistas. "Por mais inédita e controversa que seja, essa centralização também pode ser uma condição necessária para impulsionar o plano de austeridade e transformação."

Hariri, primeiro-ministro sunita do Líbano e aliado saudita de longa data, anunciou sua renúncia em uma transmissão televisionada no sábado, em uma visita a Riad, colocando o Líbano em crise ao detonar um acordo de compartilhamento de poder que incluía a milícia xiita e o partido político Hezbollah, forte aliado do Irã. Seu anúncio em Riad, e sua escolha pela rede de TV Al-Arabiya, de propriedade saudita, em vez de sua própria rede Future TV, levaram tanto os libaneses comuns quanto aqueles na elite política a sugerirem que ele estava falando sob pressão.

O anúncio da renúncia de Hariri refletiu os interesses sauditas. Ele afirmou que havia sido alvo de um plano de assassinato e culpou a influência do Irã sobre a política libanesa por sua decisão de deixar o cargo, seu segundo mandato como primeiro-ministro do Líbano desde o assassinato de seu pai, Rafik Hariri, em 2005, que, acredita-se, tenha sido perpetrado por agentes pró-Hezbollah.

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Hariri anuncia sua renúncia na Al-Arabiya, de Riad.

"Não há lugar onde o Irã vá e não plante medo e destruição", disse Hariri, referindo-se às batalhas militares e políticas em andamento entre Teerã e aliados sauditas no Líbano, no Bahrein, na Síria e no Iêmen. "O Hezbollah afirma ser um combatente da resistência, mas aponta suas armas para os sírios e para os iemenitas."

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã, Bahram Qassemi, descreveu a renúncia de Hariri como parte de uma trama "para criar novas tensões no Líbano e [na] região", de acordo com uma declaração citada pelas agências de notícias iranianas.

"A renúncia sem precedentes de Hariri, assim como seu anúncio em um país estrangeiro, não só são infelizes e surpreendentes, como também mostram que ele está participando do jogo projetado pelos mal-intencionados da região", disse ele.

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, chamou a renúncia de Hariri de "alerta para a comunidade internacional" sobre a crescente influência do Irã.

"Esta agressão ameaça não apenas Israel, mas todo o Oriente Médio", disse Netanyahu. A comunidade internacional precisa se unir e enfrentar esta agressão".

Nas ruas de Beirute, muitos se preocuparam com uma possível deterioração da segurança, que já é frágil devido à guerra em andamento na vizinha Síria, e uma inundação de refugiados sírios se protegendo do conflito dentro do Líbano. Correram boatos de que o próprio Hariri estava sob detenção saudita. De acordo com informantes, funcionários do Future Movement, o partido político que ele herdou de seu pai, não sabiam que ele estava prestes a renunciar e ficaram atordoados com sua retórica estranhamente dura. Michel Aoun, presidente pró-Hezbollah do Líbano, disse que iria esperar a volta de Hariri para Beirute antes de reconhecer a renúncia e começar o processo de formação de um novo governo.

"A renúncia de Hariri é muito surpreendente e temo que o Líbano tenha entrado no conflito regional", afirmou o legislador Ghassan Moukheiber.

Theodore Karasik, consultor sênior da Gulf State Analytics, uma empresa de consultoria, disse que a renúncia de Hariri e a expurgação de funcionários e empresários sauditas provavelmente estavam conectadas e que tudo tinha a ver com a revelação de uma cultura de "bakhshish", suborno pago por contratos públicos no Líbano. Hariri tem dupla cidadania: libanesa e saudita.

"As acusações vão ao centro da cultura bakhshish, especialmente entre o Líbano e a Arábia Saudita, principalmente nos casos de Talal e dos chefes da rede de TV", disse ele. "Para outros, a corrupção é em relação aos contratos de construção. Alguns desses contratos são com as forças armadas sauditas."

Horas após a demissão de Hariri, houthis do Iêmen, a milícia pró-iraniana que derrubou o governo reconhecido pela ONU em Saná e está presa em uma guerra com a Arábia Saudita, dispararam um foguete de alcance médio que atingiu Riad.

Os houthis anunciaram em seu canal de TV, Al-Masirah, que lançaram "um míssil balístico de longo alcance" visando o Aeroporto Internacional Rei Khalid, o segundo mais movimentado da Arábia Saudita. A Al-Arabiya informou mais tarde que o míssil havia sido interceptado.

Ainda não está claro se o anúncio de Hariri e o lançamento do míssil estavam conectados. Um dia antes de Hariri renunciar, ele se encontrou em Beirute com Ali Akbar Velayati, principal assessor do líder supremo do Irã, Ali Khamenei. Poucos detalhes da reunião foram revelados, mas uma fonte citada pela Agência de Notícias Fars, do Irã, disse que os dois discordaram sobre o Iêmen, com Velayati rejeitando uma proposta saudita de acabar com uma crise que tem sido um peso para os cofres de Riad.

O lançamento do míssil ocorreu três dias após a coalizão liderada pelos sauditas — que luta contra os houthis no Iêmen — lançar um ataque aéreo que atingiu um mercado no reduto houthi de Sa'dah, matando 26 pessoas, incluindo civis. Um porta-voz da coalizão saudita disse, no sábado, que o objetivo do ataque aéreo era eliminar um "legítimo alvo militar de alto valor".

Este post foi traduzido do inglês.

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