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As pessoas que trabalham em bares e restaurantes estão se perguntando o que fazer nos próximos meses

"Tem sido um período muito difícil e desafiador para as pessoas do setor de serviços e hotelaria"

Pessoas que trabalham em bares, restaurantes e clubes ficaram desalentadas nesta semana depois que vários estados americanos — incluindo Nova York, Califórnia, Washington, Louisiana, Colorado, Pensilvânia e Nova Jersey — fecharam bares e clubes, e restringiram drasticamente o funcionamento de restaurantes para deter a disseminação do coronavírus.

"Eu praticamente não tenho mais emprego", disse Beth Willow, uma bartender de 28 anos de Nova Orleans que sobrevive entre um salário e outro, ao BuzzFeed News.

Na segunda-feira, o bar do French Quarter onde ela trabalha, Jewel of the South, foi fechado após as novas diretrizes anunciadas pelo governador da Louisiana, que vão vigorar por um mês. Agora, o local estará apenas entregando comida. "Ninguém pede coquetéis artesanais via Uber Eats — embora devesse fazer isso", disse Beth.

"Tenho a sorte de morar com meu parceiro e ter alimentos e suprimentos estocados, mas o que acontece depois? Como vamos pagar o aluguel e as contas?", perguntou ela.

Os funcionários do setor de serviços e hotelaria correm um risco maior que muitas outras profissões de pegar o coronavírus devido à sua proximidade com os clientes. Muitos usam o transporte público para ir trabalhar, onde lidam com dinheiro, alimentos e bebidas — geralmente em espaços fechados.

Mas o encerramento total e imediato do trabalho deixou os funcionários do setor de serviços e hotelaria numa situação financeira precária. Afinal, essa já é uma força de trabalho tradicionalmente informal, com poucos benefícios ou proteções. Muitos trabalhadores se preocupam mais com o impacto financeiro que estão enfrentando do que com os riscos potenciais associados ao coronavírus.

"Eu não estou preocupada com o vírus, mas sim com todas essas outras coisas", disse Maja, uma dançarina de 35 anos que trabalha em dois clubes de striptease de Nova Orleans e pediu para ser identificada apenas pelo primeiro nome.

Por dias, os donos de bares e restaurantes assistiram à desaceleração dos negócios em meio ao aumento das notícias sobre o coronavírus e se perguntaram como deveriam lidar com isso. Eles deveriam fechar como uma precaução de saúde pública — e deixar os funcionários sem trabalho — ou esperar o governo os obrigar a fazer isso?

"É muito difícil assimilar a gravidade da situação", disse Alex Guzman, um chef de 44 anos e sócio do Archer & Goat, um restaurante de bairro no Harlem, Nova York.

No domingo, Alex se reuniu por quatro horas com sua esposa e sócia, Jenifar Chowdhury, de 41 anos, e seus outros sócios. Juntos, eles analisaram os números para descobrir se poderiam se dar ao luxo de permanecer abertos como um restaurante com pedidos para viagem. Eles decidiram que fazia mais sentido fechar por completo se as restrições fossem anunciadas, o que o prefeito Bill de Blasio acabou fazendo naquela mesma noite. "Por A mais B, nós pagamos nossas contas vendendo álcool", disse Alex.

A dona de bar Ivy Mix, cujo bar de coquetéis no Brooklyn, Leyenda, aclamado pela crítica, incluindo uma indicação ao James Beard Awards, decidiu fechar ao meio-dia de domingo, depois de receber críticas de moradores locais por inicialmente permanecerem abertos. "Recebemos mensagens on-line bem desagradáveis​", disse Ivy, de 34 anos.

Foi só depois que seu locatário concordou em suspender o aluguel do bar que Ivy decidiu ir em frente e fechar — poucas horas antes da decisão do prefeito.

"Tem sido um período muito difícil e desafiador para as pessoas do setor de serviços e hotelaria", disse ela. "Não temos planos de previdência privada, folgas ou licenças médicas remuneradas. Quando trabalhamos, nós somos pagos. Quando meu bar está aberto, eu sou paga."

April Glick, que tem 31 anos e trabalha no bar de coquetéis Ampersand em Manhattan, queria que bares e restaurantes fechassem por causa da necessidade de saúde pública do distanciamento social para deter a disseminação do coronavírus. "Quantos cartões de crédito eu toquei nas últimas duas semanas? Tenho pensado nisso sem parar", disse April.

Mas ela também está profundamente preocupada com as implicações financeiras que o fechamento dos estabelecimentos terá sobre ela e outros trabalhadores. "É claro que eu quero fazer isso pelo bem maior, mas também gosto de pagar meu aluguel", disse April.

A capacidade, ou a incapacidade, de pagar o aluguel é uma das principais preocupações de muitos no setor de serviços e hotelaria — seja o aluguel de sua casa, seja o de seu negócio.

Miles Sykes, um pai solteiro de 32 anos que ganha cerca de US$ 2.100 por mês como cozinheiro do BJ's Restaurant and Brewhouse, em Sacramento, está extremamente preocupado com a forma como vai pagar o aluguel neste mês. Seu expediente foi reduzido, e ele perdeu US$ 500 em apresentações de drag queen canceladas em clubes.

"Fiquei muito estressado ontem", disse ele ao BuzzFeed News na segunda-feira. "Eu divido a guarda do meu filho com a minha ex e, se não puder pagar o aluguel... Não vou mais poder passar tempo com ele."

O governador da Califórnia, Gavin Newsom, anunciou na segunda-feira que os despejos seriam interrompidos e as execuções hipotecárias seriam desaceleradas para ajudar a proteger as pessoas com dificuldades financeiras durante a crise. Nova York anunciou uma pausa semelhante nos despejos.

Essas medidas foram aplaudidas, mas ainda não são suficientes, de acordo com os funcionários do setor de serviços e hotelaria que falaram com o BuzzFeed News.

"O ideal seria que eles suspendessem o pagamento de aluguéis", disse Miles, que está procurando um colega de quarto para dividir o aluguel de US$ 1.710 de sua casa com dois quartos, mas teme que agora isso seja quase impossível. "Somos nós que ganhamos dinheiro para as [grandes corporações], mas não recebemos nenhuma ajuda."

Embora alguns no setor de serviços e hotelaria tenham um parceiro que ainda está trabalhando e obtendo renda, outros descobriram que seus parceiros também estavam com problemas financeiros. O parceiro de Beth, um barman de Nova Orleans, trabalha em eventos. "Ele tinha eventos marcados para abril inteiro, e cada um deles foi cancelado", disse Beth.

Michael Garabito preparou e serviu bebidas como barman no Metropolitan Opera, no Lincoln Center em Nova York, por 20 anos, mas o Met Opera fechou em 12 de março devido a preocupações com o coronavírus. Sua esposa dá aula para alunos com necessidades especiais numa escola no Harlem e, como as escolas também pararam, seu trabalho também parou. "Não estamos recebendo mais nenhum dinheiro", disse Michael, de 42 anos, ao BuzzFeed News.

Normalmente, ele ganha entre US$ 900 e US$ 1.100 a cada duas semanas, e sua esposa leva para casa US$ 1.200. O aluguel mensal do apartamento deles no Bronx é de US$ 1.200, e os serviços de utilidade beiram os US$ 1.500. "Isso significa que, nas próximas três semanas, se nada acontecer, eu vou à falência", disse Michael.

Um relatório da Reserva Federal de 2019 mostrou que 39% dos americanos teriam dificuldades ou seriam incapazes de pagar uma despesa inesperada de US$ 400. Mas, mesmo entre pessoas com algumas economias, a incerteza causada pelo coronavírus é um pesadelo.

"Eu guardei bastante e ainda estou numa situação terrível", disse Jordan Schauberger, um garçom de 25 anos que trabalha no Dylan, um restaurante de brunch em Orange County, Califórnia. Jordan prevê que sua renda mensal de US$ 2.500 cairá pela metade quando o restaurante passar a atender apenas pedidos para viagem. Ele disse que ele e a namorada, cujo trabalho no campus também foi drasticamente cortado, em breve viverão apenas de economias.

Outros queriam ter se empenhado mais para guardar dinheiro.

Maja, a dançarina de dois clubes de striptease na Bourbon Street, em Nova Orleans, começou a trabalhar todos os dias da semana passada para criar o máximo de reserva financeira possível. Ela trabalhou o fim de semana inteiro e presenciou as tentativas da polícia de fechar bares e pedir às pessoas que estavam nos estabelecimentos lotados que fossem para casa, incentivando o distanciamento social para deter a disseminação do vírus. "Como eu queria ter guardado mais", disse ela.

Muitas pessoas com quem o BuzzFeed News conversou estão numa situação parecida.

Miles, o cozinheiro de Sacramento, está tentando desesperadamente pegar serviços no DoorDash para pagar o aluguel.

Michael, o barman do Met Opera, disse que todo o dinheiro que ele e a esposa tinham economizado para comprar uma casa será usado para pagar as despesas enquanto os dois estiverem desempregados.

April, a funcionária de um bar de coquetéis em Manhattan, calcula que ela consegue ficar de três a quatro semanas sem renda, mas alguns amigos lhe enviaram dinheiro pelo Venmo ao saber que ela perdeu o emprego.

Beth, a garçonete de Nova Orleans, calcula que ela tem suprimentos e dinheiro para umas três semanas antes que ela e seu parceiro precisem pedir ajuda à família.

"É fácil se preocupar mais com o aspecto da saúde, mas ainda existe um outro lado que também pode ser devastador para algumas pessoas", disse Jordan, o garçom de Orange County.

No domingo à noite, o restaurante do Harlem, Archer & Goat, dispensou seus cinco funcionários que trabalhavam por meio período. Depois de sua semana mais movimentada de todos os tempos desde a inauguração em fevereiro de 2019, na semana passada houve uma redução de 60%. Todas as reservas de fim de semana para grupos foram canceladas. Eles precisavam "parar o sangramento", disse Alex, chef e sócio.

Ele e a esposa/sócia Jenifar esperam que outras opções possam se concretizar para ajudar a apoiar seus oito funcionários por período integral, que acabaram de receber o último pagamento deles. Jenifar estima que eles, como donos, possam sobreviver dois ou três meses com o restaurante fechado antes que seja impossível reabri-lo.

O Senador Mitt Romney sugeriu nesta semana um pagamento único de US$ 1.000 a cada adulto americano para "ajudar a garantir que famílias e trabalhadores possam cumprir suas obrigações de curto prazo e aumentar os gastos na economia". Na terça-feira, o Presidente Trump e o Secretário do Tesouro, Steve Mnuchin, deram a entender que estavam tentando colocar esse plano em ação.

Muitas das pessoas com quem o BuzzFeed News conversou imploraram ao governo para ajudar as empresas afetadas e seus trabalhadores.

"Não ter linhas de crédito, não ter reservas em dinheiro, não poder oferecer plano de saúde para nossos funcionários, não poder oferecer licença médica remunerada — é muito delicado", disse Jenifar. "Precisamos de dinheiro e subsídios para sair dessa."

O casal também quer que os locatários suspendam o pagamento de aluguéis neste mês. O imposto sobre vendas do restaurante é devido no dia 20 e há uma taxa de 10% para pagamentos em atraso, que eles esperam que sejam suspensos.

A cidade de Nova York está oferecendo empréstimos sem juros de US$ 75.000 a pequenas empresas que foram afetadas por uma queda de 10% nos negócios por causa do coronavírus, mas Ivy, a dona de bar do Brooklyn, não acredita que conceder mais empréstimos às empresas vá ajudar. Em vez disso, ela quer subsídios. "Eles vão ter que doar os US$ 75.000 para os bares e restaurantes", disse ela.

O garçom do Metropolitan Opera, Michael, disse esperar que as proteções do governo para salários perdidos sejam implementadas. "Devíamos ser pagos pelos dias em que não estamos trabalhando", disse ele, "porque não fomos nós que criamos esse problema".

A dona de restaurante Jenifar disse que os fechamentos destacaram a rapidez com que o setor de serviços e hotelaria pode entrar em colapso: "Eu só espero que... quando tudo voltar a uma certa estabilidade, o governo realmente providencie proteções para esse setor", disse ela.

Até lá, trabalhadores e empresas estão tentando ser criativos.

O Governador de Nova York, Andrew Cuomo, anunciou que, devido ao fechamento do setor de serviços, os bares e restaurantes poderiam começar a vender bebidas alcoólicas para viagem.

Na manhã de terça-feira, Alex decidiu começar "praticamente uma barraca de limonada para adultos", vendendo coquetéis exclusivos do Archer & Goat por US$ 30 o litro. "É um show de um homem só", disse ele. "Eu não tenho condições de pagar funcionários."

Ivy disse que espera reabrir o Leyenda o mais rápido possível, mesmo que esteja vendendo tacos e margaritas para viagem pela janela. Pela primeira vez, o bar também começou a vender vale-presente.

Miles disse que viu muitos artistas locais colocarem o Venmo deles nas redes sociais ou postar shows feitos em casa e pedir doações, já que os clubes estão fechados.

Maja, a dançarina de Nova Orleans, planejava passar o verão visitando a família na Polônia. Agora, ela não consegue trabalhar e se pergunta quando voltará a fazer isso.

"Todo esse fechamento me deixa mais angustiada do que a possibilidade de pegar esse vírus", disse ela.

Este post foi traduzido do inglês.

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