Eu tinha certeza de que congelar meus óvulos resolveria tudo

    Com 35 anos e solteira em Nova York, eu estava convencida de que eu ficaria sozinha para sempre. Submeter-me a um procedimento caro para ganhar tempo parecia uma boa escolha.

    Não sei dizer o exato momento em que comecei a pensar se eu era capaz de ter filhos, mas isso ocorreu em algum momento entre fevereiro de 2012, quando o cara que eu estava saindo nos últimos meses terminou comigo, e maio de 2012, quando fiz 35 anos, porque após essa idade toda mulher solteira de Nova York sabe que ninguém nunca vai te amar.

    Eu sabia que, muito, muito, muito no fundo, isso não era verdade - e que, de fato, as pessoas podem encontrar um amor e ainda ter filhos depois dos 35 anos, mesmo em New York City - mas parecia que este conhecimento era uma minúscula pérola de razão que tinha sido envolta em fita adesiva, colocada em uma caixa de aço bloqueada com um código de segurança e lançada para o espaço, e, portanto, inacessível.

    Além disso, eu nunca fiquei grávida, então havia uma parte de mim que estava convencida que tinha alguma coisa errada com meus ovários; em 15 anos (ou mais) que eu transo, só me preocupei duas vezes em tomar pílula do dia seguinte por causa de camisinha furada ou por alguém que gozou dentro. Eu pensei comigo mesma que se eu não fosse infértil, teria feito pelo menos um aborto na vida, e secretamente invejei minhas amigas que fizeram abortos, porque pelo menos elas sabiam que podiam engravidar.

    Namorar ficou estranho. Eu realmente não queria mais namorar - eu ainda estava pensando no cara que me deu o fora em fevereiro, ainda estava muito triste e acabei chorando durante a Savasana, e chorei ainda mais forte quando eu percebi que eu me tornei uma daquelas mulheres que choram na yoga.

    Mas a voz interior que me diz todas as manhãs e todas as noites que meu relógio biológico estava correndo era a mesma voz que me colocou no OkCupid e HowAboutWe, apesar de eu acabar encontros medíocres que fizeram eu me sentir ainda pior. Isso é o que está disponível por aí? E ao mesmo tempo: uma cara desse poderia ser a pessoa com quem eu quero criar um outro ser humano?

    O que eu realmente precisava era tempo. Tempo para conhecer pessoas, sem a pressão de tentar descobrir, dentro de cinco minutos, se iríamos fazer um bebê lindo e normal. Então eu li um artigo sobre congelamento de óvulos, que dizia que esse procedimento estava se tornando cada vez MAIS SEGURO E MAIS BEM SUCEDIDO DO QUE NUNCA!!!!!!!! - Ou pelo menos foi o que eu captei – e então eu pensei, Tempo. Isso vai me dar tempo. Eu marquei uma consulta.

    Você poderia dizer que eu estava em pânico e você não estaria completamente errado. Mas eu fui mal acostumada porque eu sempre namorei entre os vinte cinco e trinta e poucos anos, o que significava que eu sempre tinha um acompanhante para ir aos casamentos. Mas as coisas mudaram depois que eu terminei com o Namorado Sério, que eu achava que poderia ser O CARA, ainda que eu não acreditasse na idéia de que existe essa coisa de O CARA - talvez um dos vários CARAS em potencial? Mas cheguei perto de um cara potencial, fomos morar juntos, nossas famílias se conheceram, e ele me contou sobre o monstruoso diamante de 6 quilates que ele e seu irmão iriam supostamente dividir com suas pretendentes (eu imaginei um homem de quipá na 47th Street cortando-o precisamente ao meio com um laser) - De repente eu havia me tornado, aos 33 anos, a Amiga Solteira, porque eu nunca estava namorando alguém por tempo suficiente para que ele fosse um potencial acompanhante de casamento. Ao mesmo tempo, eu nunca podia ser a única solteira na mesa dos casais, ou tinha que bater um papo constrangedor com o único cara solteiro no casamento, bonitão e gentil, mas que acabou de sair de um divórcio feio, um cristão muito religioso, que tinha dois filhos e vivia no campo, e ainda pensar: Bem, isso pode funcionar.

    Eu me afastei dos meus amigos casados, principalmente porque eles me faziam lembrar do meu fracasso pessoal. Ao mesmo tempo em que eu não me desculpava por ser egoísta ao fazer isso, eu estava me permitindo ser egoísta. Eu saí do OkCupid e disse aos meus amigos que, mesmo que eu tivesse 99% de certeza que eu nunca mais faria sexo de novo, era libertador ficar sozinha, e nunca mais ter que pensar sobre as necessidades ou medos de qualquer outra pessoa. Mas também significava que eu era a única pessoa que estaria me ouvindo.

    Nos meus vinte e poucos anos, eu sentia que com a experiência da luta, vinha a experiência das possibilidades, e ter possibilidades continuava a ser algo emocionante. Cada escolha não tinha o poder de alterar algo profundamente naquela época minha vida, era como aqueles livros que dizem “Escolha a sua própria aventura” e que ainda podem ter muitos diferentes finais. Com meus trinta anos, porém, as escolhas começaram a ser muitas, cada uma me empurrando para um caminho sem volta. Eu comecei a ver com outros olhos a religião - nunca mais ter que tomar qualquer decisão, ótimo! Eu pensava que havia uma certa liberdade nisso também.

    Contei para minha terapeuta que eu estava pensando em congelar meus óvulos, e ela achou que era uma boa idéia e que poderia aliviar um pouco da ansiedade de encontrar um namorado. E então eu disse que isso poderia me causa um outro tipo de ansiedade, porque esse procedimento é muito caro em Nova York - milhares de dólares em exames, depois milhares de dólares em medicamentos para estimular a maturação dos ovos, e milhares de dólares para a retirada dos óvulos. Tudo junto custaria perto de US$ 15.000 para comprar alguns anos de redução da ansiedade, e ainda mais $ 2.000 dólares por ano para mantê-los congelados. Eu disse para mim mesma que poderia parcelar em cinco anos e não me parecia tão ruim. Mas eu ainda precisava levantar o dinheiro, depois eu pegaria minhas economias e o que faltasse eu passaria no meu cartão de crédito.

    Eu tinha a idéia de que o congelamento dos óvulos era certo; que eu guardaria meus óvulos, e alguns anos depois, quando eu decidisse que estava preparada para ter filhos, eu simplesmente bateria na porta da velha “clínica de fertilidade” e eles enfiaram umas agulhas em mim e voilà, bebês! Mas não era bem assim, de acordo com o médico especialista em fertilidade com quem me consultei, e que tinha uma atitude do tipo "eu sei o que é melhor para você" misturada com a de um bom vendedor. Para ele, congelar meus óvulos só garantia 40% de chance de sucesso. Ele deve ter visto minha cara de decepção pois ele me garantiu que na verdade eu teria o dobro de chance de sucesso, se comparado aos métodos naturais e, se eu esperasse mais alguns anos, minha fertilidade iria cair dramaticamente. Ele fez um rascunho tosco disso enquanto a gente estava conversando, e eu juro que senti minha fertilidade cair ainda mais.

    Mas como 40% é melhor do que 0% ou ainda 20%, eu o deixei colher meu sangue e fazer uma ultrassonografia. Os exames monstraram que eu estava saudável, e que eu tinha óvulos e que daria certo.

    Tudo correria bem. Eu ficaria bem.

    Ainda assim, tive momentos de profunda e apavorante solidão. Algumas vezes eu tentei me convencer de que esses momentos me deixavam de alguma forma uma pessoa mais forte, porém outras vezes eu pensava, Foda-se ser uma pessoa mais forte – qual é a vantagem em ser uma pessoa mais forte? Na época do furacão Sandy, eu estava sentada no meu sofá, no meu apartamento em Fort Greene, Brooklyn, e o vento e a chuva não me apavoraram menos que o sentimento de estar realmente sozinha, e que eu poderia ser uma desses pessoas da Staten Island afogadas em suas próprias casas, e que só tiveram seus corpos descobertos após dias.

    Depois de alguns dias eu fui ao Chelsea, onde eu era voluntária para caminhar uma vez por semana com o cachorro de uma senhora de idade com deficiência, só para ver se ela estava bem porque ela não estava atendendo o telefone, e descobri ela estava sentada em seu apartamento no escuro com o cachorro. Tudo cheirava mal, mas ela parecia estar relativamente bem, então eu passeei com o cachorro e quando eu voltei eu lhe dei a minha lanterna, e ela me perguntou, com uma voz verdadeiramente solitária, quando eu lhe faria uma nova visita.

    Eu não contei a muitas pessoas que eu estava planejando congelar meus óvulos – era pra ser uma coisa só minha, o mundo não precisava saber. Mas eu acho que o que eu realmente temia era aquele olhar de piedade nos olhos das pessoas que em seguida me diriam "que boa idéia você teve". Eu vi esse olhar - pelo menos, eu achei que eu vi - em alguns grandes amigos para quem eu contei, aqueles que me disseram estarem admirados com o que eu estava fazendo e tiveram compaixão de como é punk que o relógio biológico era tão real e como é punk ser tão caro, e como isso tudo é tão punk.

    Eu entrei em contato com a clínica de fertilidade e disse que queria fazer o procedimento em fevereiro 2013 - você tem que marcar com alguns meses de antecedência, e eu estava indo para Los Angeles onde eu ficaria quase o mês inteiro de janeiro a trabalho. Eles me disseram que eu deveria ir à clínica para os últimos exames e para uma consulta onde a enfermeira iria me dar todas as orientações. Na consulta eu me sentei em uma mesa de reunião com outras quatro mulheres; cada um tinha um pasta na sua frente com vários documentos e folders. Tudo tinha de ser executado perfeitamente: você deve pegar os medicamentos que são vendidos em um das poucas farmácias da cidade e eles sugeriram comprar apenas uma leva de cada vez, porque eles devem ser mantidos na geladeira e custam milhares de dólares e você não vai querer que eles estraguem. Depois, vinha uma programação de 2 semanas de injeções hormonais – cada uma teria um diferente coquetel prescrito por eles, escrito em uma folha de papel por nossos respectivos médicos da clínica, de acordo com a nossa idade e taxa de fertilidade - e uma agenda de quando nós deveríamos voltar à clínica para outros exames. Eles nos ensinaram a usar as seringas especiais. Uma mulher levantou o braço, disse que tinha medo de agulhas e perguntou se ela podia contratar uma enfermeira para vir ao seu apartamento duas vezes ao dia para fazer a aplicação. (Sim, mas isso seria bem caro.) Você não poderia fazer atividades físicas por duas semanas, e você poderia ficar toda inchada e toda dolorida por um bom tempo, e ainda ficar chorona apesar da enfermeira, muito profissional, provavelmente não ter usado a palavra "chorona”.

    Então, quando os hormônios tiverem estimulado todos o seus óvulos a amadurecer e serem liberados e você estiver ovulando, você deverá voltar à clínica e um dos médicos irá extrair seus ovos e congelá-los. Nós devemos nos certificar de ter uma pessoa para nos acompanhar e eu mentalmente listei os amigos com quem eu poderia contar. Surgiram alguns candidatos potenciais, e então momentaneamente senti pena de mim mesma por não ter um namorado ou marido para me acompanhar. Foi quando eu lembrei que era exatamente por não ter um namorado ou marido que eu estava fazendo tudo isso e que de uma forma complicada isso poderia ser algo que poderia me ajudar a arrumar um namorado ou marido, e eu me senti um pouco melhor.

    A enfermeira nos disse que os óvulos ficariam guardados na própria clínica e ela garantiu que não havia risco em caso de enchente ou falha de energia; houve um fato famoso em uma clínica da NYU, do famoso no hospital universitário de NY, da qual os pacientes tiveram que ser retirados por conta de falha de energia e enchente durante um furacão. Então eu pensei Ninguém iria cuidar de um cooler cheio de óvulos durante um furacão, iria? Antes de sair, eu assinei um formulário que dizia que se eu por acaso não quisesse mais meus óvulos, ou se eu parasse de pagar pelo seu armazenamento, eu gostaria que eles fossem destruídos.

    Eu passei a maior parte de janeiro 2013 em Los Angeles a trabalho, e quando eu conto o porque de eu ter decidido me mudar, eu gosto de dizer que a abundância de Pasadena Whole Foods foi o que me fez decidir, o que sempre provoca muitas risadas. Particularmente por vir de uma pessoa que já tentou comprar hortaliças na Key Foods na Avenida A ou esperou na fila, na chuva, no Trader Joe da 14th Street só para entrar, ou visitou o Union Square Whole Foods em uma tarde de domingo e quis morrer. Certamente isso foi um fator, mas também um encontro para um café que eu tive com amigo de um colega que procurava, eu acho, um emprego, e que acabou terminando em uma discussão sobre sair com alguém em Los Angeles versus em Nova York.

    Namorar, disse ele, era muito difícil, em Los Angeles.

    "Ah, é?", Eu disse.

    "Sim", disse ele. "É muito mais difícil do que era em Nova York. Quer dizer, eu era um cara na mídia em Nova York. Não era exatamente difícil para mim. "

    Eu olhei para aquele homem normal, e pensei: Certo. Tenho certeza de que não era.

    O resto aconteceu rápido. Eu voltei para Nova York e meu chefe concordou que mudar para LA era uma boa idéia, então lá estava eu orçando mudanças e procurando apartamentos pela internet. E ficando animada por não ter que comprar um novo casaco pesado de inverno, tipo, nunca mais. Ocupada com os preparativos da mudanças para o outro lado do país, eu quase me esqueci que eu deveria estar me preparando para garantir que no meu futuro eu poderia contar com 40% de chance de conceber artificialmente uma criança.

    E então, no último momento possível, mais ou menos um dia antes da minha menstruação, eu decidi que eu não iria levar isso adiante.

    Eu percebi que estava colocando todos os meus ovos, literalmente, na mesma cesta, assim como diz o ditado americano. Eu tinha depositado tanta coisa na idéia de congelar meus óvulos, que eu esperava ver todas as minhas ansiedades e medos sobre envelhecer solteira e morrer sozinha desaparecerem instantaneamente no segundo em que eu iniciasse todo o processo.

    Mas eu também senti que se eu passasse por esse processo, meus óvulos seriam deixados para trás em Nova York, em um refrigerador, em alguma placa de Petri ou tubo de ensaio ou seja lá onde for que eles os preservem, e eu estaria do outro lado do país. Isso significaria nenhuma ruptura, nenhum novo recomeço. Eu estaria deixando uma parte de mim a 3.000 milhas de distância, mantendo apenas uma conexão microscópica com minha vida antiga, e eu não teria a ruptura com todas essas coisas que me faziam ficar ansiosa.

    Em vez disso, eu me mudei para Los Angeles, sem ter certeza de estar fazendo a coisa certa, mas com a certeza de que eu não estava fazendo a coisa errada. Eu até pensei que talvez, um dia, eu poderia achar aquela caixa trancada que deveria estar voando no espaço, e que eu achei estar totalmente perdida.